Perco o rumo no batuque que escuto ao longe. Ele está por
toda parte nesse Rio de sujeira, permissividade, culto ao corpo, inculto de
valores. Diz a lenda que o nome disso é Carnaval, festa profana, insana, que
brota do nada uma alegria produzida, sem razão, incendeia e apaga por quatro
dias preocupações de outros 361 do ano . O sorriso aberto vem de quem chora no
ombro da cuíca, um lamento ritmado, a disfarçar mágoas, ressentimentos,
decepções, contrastadas com o repique do surdo, que só ouve a fuzarca dos
blocos humanos e escuta a introdução de mais uma marchinha, composta no início
do século passado. O carnaval reencarna em cada um, o melhor e o pior das
essências dos sentimentos perdidos no planeta. Como diz o poeta: “ é a invenção
do diabo, que Deus abençoou”. Acho meu rumo ao pegar a estrada no sentido
contrário. O som do tamborim vai se afastando, o pandeiro ficou pra trás, na disritmia
dos meus passos, em busca do silêncio de uma outra sinfonia: a orquestra da mata atlântica, onde
ecoam trinados gerados pela alvorada, o farfalhar da folhagem, que se deixa
levar e seduzir pelo vento, um embalo incessante, calmo, sereno molhado pela
corredeira do rio gelado a deslizar sem parar cachoeira abaixo. O ritmo do meu
Carnaval é frenético também, provoca euforia, prazer, namora de olhos fechados
com a natureza, entra em harmonia com a bateria do meu coração, em compasso
coreografado passo a passo, ao encontro do meu ser.
Bom Carnaval!!!